

Vidas apagadas!
Era conhecida por Gracinda "Cega" , e morava no eido.
Fora casada com um tal "
Matas"da Matancinha, que, muito cedo a abandonara com o filho.
Carregava consigo o peso de uma miséria tremenda e mendigava esmola para si e para o seu rebento.
Era muito mais velho do que eu, o Justino, seu filho… Tinha a esquisita cor da miséria, e viera a morrer com mais de treze anos de idade, vítima das doenças sem nome que sempre o acompanharam.
Ao pai, nunca mais se viera a conhecer paradeiro.
Após a morte do Justino, também a mãe morrera, poucos dias ou poucos anos mais tarde.
Antes porém, mãe e filho passavam todos os dias à minha porta passo lento, muito lento, descalços e despidos – ou quase – deixando-me ver a tal cor da doença, da invalidez, e da miséria…
Quem se lembra hoje destas vidas, de existência tão breve e tão apagada quão sofrida, perdidas nos percalços da vida?
O Ti Jaquim Costa era maneta das duas mãos, ou melhor dito, era braceta, pois lhe faltavam os dois braços.
Perdera-os muito novo, enquanto combatente em França durante a primeira guerra mundial. Era casado com a Ti Filomena " Pangantum" e vivia numa casa junto ao tanque.
Lembro-me de ele andar sempre a tentar enxotar galinhas com simulados pontapés, dos quais, mais depressa enxotava os tamancos para longe dos pés, do que as galinhas do seu lugar de eleição.
Consta que viveria de uma tença que lhe fora atribuída pelo Estado e que a Ti Filomena gastaria logo que recebida, naquela sua cantilena pegajosa: pangantum, pangantum, pangantum, fica sem nenhum.
Contaram-me de fonte segura, que este homem, ia ao souto com as mangas do casaco atadas nas pontas e estendendo o casaco no chão, varria com os pés as castanhas para cima do casaco, enchendo assim as mangas; quando tinha as mangas cheias, pegava no casaco com os dentes e com um safanão e torcedela de pescoço, o atirava para as costas e levava para casa.
Não terá tido descendentes, e em si, terá ficado cerceada toda a sua genealogia.
A Ti Filomena "Pangantum" sobrevivera ainda muitos anos, porém das filhas que eu julgo que ela tivera – talvez de outro casamento – e teriam chegado a ser gente adulta, ninguém se lembrará já hoje na Póvoa.
Ou será isto, confusão da minha memória?
O Ti Liraxas era irmão do Ti Catrino e tal como este, vivia no eido Casara e vivera com a Tia Pita, que era da árvore genealógica dos Pitas de Penude, porqueiros por tradição.
Ainda por continuidade de tradição, também este casal fez durante muito tempo vida de porqueiros, isto é, andavam de feira em feira comprando e vendendo porcos.
Foi também este, um casal machorro, que não prolongou descendência.
A Tia Pita – que gostava muito da pinga – avariou-se do miolo ainda bastante nova; Eram no entanto dela as melhores azeitonas que se curtiam na Póvoa.
Tinha a mania de falar telegráfica e secretamente com o S. Pedro, e fazer previsões de todos os acontecimentos.
Certo dia a Tia Pita chega à taverna e diz: - Dá-me daí um trigo ( pão de duas cabeças), uma tigela e um cortilho. – Satisfeita esta vontade, parte o pão em pequeninos bocados para dentro da tigela e afoga-o ou ensopa-o com o tal cortilho e diz de novo: - Se este trigo tão pequenino bebeu um cortilho, bota-me lá também dois cortilhos para mim.
Assim, foi tratada para casa, com um lanche composto por um trigo e três cortilhos de vinho.
Quem saberá daqui a alguns anos que estas pessoas habitaram a Póvoa?
Era conhecida por Gracinda "Cega" , e morava no eido.
Fora casada com um tal "

Carregava consigo o peso de uma miséria tremenda e mendigava esmola para si e para o seu rebento.
Era muito mais velho do que eu, o Justino, seu filho… Tinha a esquisita cor da miséria, e viera a morrer com mais de treze anos de idade, vítima das doenças sem nome que sempre o acompanharam.
Ao pai, nunca mais se viera a conhecer paradeiro.
Após a morte do Justino, também a mãe morrera, poucos dias ou poucos anos mais tarde.
Antes porém, mãe e filho passavam todos os dias à minha porta passo lento, muito lento, descalços e despidos – ou quase – deixando-me ver a tal cor da doença, da invalidez, e da miséria…
Quem se lembra hoje destas vidas, de existência tão breve e tão apagada quão sofrida, perdidas nos percalços da vida?
O Ti Jaquim Costa era maneta das duas mãos, ou melhor dito, era braceta, pois lhe faltavam os dois braços.
Perdera-os muito novo, enquanto combatente em França durante a primeira guerra mundial. Era casado com a Ti Filomena " Pangantum" e vivia numa casa junto ao tanque.
Lembro-me de ele andar sempre a tentar enxotar galinhas com simulados pontapés, dos quais, mais depressa enxotava os tamancos para longe dos pés, do que as galinhas do seu lugar de eleição.
Consta que viveria de uma tença que lhe fora atribuída pelo Estado e que a Ti Filomena gastaria logo que recebida, naquela sua cantilena pegajosa: pangantum, pangantum, pangantum, fica sem nenhum.
Contaram-me de fonte segura, que este homem, ia ao souto com as mangas do casaco atadas nas pontas e estendendo o casaco no chão, varria com os pés as castanhas para cima do casaco, enchendo assim as mangas; quando tinha as mangas cheias, pegava no casaco com os dentes e com um safanão e torcedela de pescoço, o atirava para as costas e levava para casa.
Não terá tido descendentes, e em si, terá ficado cerceada toda a sua genealogia.
A Ti Filomena "Pangantum" sobrevivera ainda muitos anos, porém das filhas que eu julgo que ela tivera – talvez de outro casamento – e teriam chegado a ser gente adulta, ninguém se lembrará já hoje na Póvoa.
Ou será isto, confusão da minha memória?
O Ti Liraxas era irmão do Ti Catrino e tal como este, vivia no eido Casara e vivera com a Tia Pita, que era da árvore genealógica dos Pitas de Penude, porqueiros por tradição.
Ainda por continuidade de tradição, também este casal fez durante muito tempo vida de porqueiros, isto é, andavam de feira em feira comprando e vendendo porcos.
Foi também este, um casal machorro, que não prolongou descendência.
A Tia Pita – que gostava muito da pinga – avariou-se do miolo ainda bastante nova; Eram no entanto dela as melhores azeitonas que se curtiam na Póvoa.
Tinha a mania de falar telegráfica e secretamente com o S. Pedro, e fazer previsões de todos os acontecimentos.
Certo dia a Tia Pita chega à taverna e diz: - Dá-me daí um trigo ( pão de duas cabeças), uma tigela e um cortilho. – Satisfeita esta vontade, parte o pão em pequeninos bocados para dentro da tigela e afoga-o ou ensopa-o com o tal cortilho e diz de novo: - Se este trigo tão pequenino bebeu um cortilho, bota-me lá também dois cortilhos para mim.
Assim, foi tratada para casa, com um lanche composto por um trigo e três cortilhos de vinho.
Quem saberá daqui a alguns anos que estas pessoas habitaram a Póvoa?
1 comentário:
Não sei muito bem quantas pessoas viviam no eido.Lembro-me lá viver não sei bem a onde, se na casa onde hoje vive a Maria ou numa outra, uma senhora alta e magra, que penso ser essa a tia pita, e ainda me lembro de nessa casa viver uma tal cega, que me fazia uma certa confusão, o facto de ela não ver, e estar sempre sentada ou á porta ou então na cosinha. Lembro-me ainda de um homen que vivia sosinho na ultima casa, e que na altura das matanças lá se ía com um prato cheio de comida para esse homem.
Foi bom trazeres mais este canto da Póvoa (o Eido) até nós, que vai resistindo no tempo,agora com apenas um morador.
Parabéns
Jorge
Enviar um comentário