quarta-feira, novembro 02, 2005

Testemunho de uma personalidade...

Aquela silhueta de homem alto e magro, de vestes negras e de imponente aspecto, que percorria a passos rápidos os tortuosos caminhos da nossa terra é a personagem da qual vou contar um episódio curioso.
Jamais pensei na minha adolescência ou na juventude que aquele homem de ar solene e postura intelectual, de óculos redondos e pequenos pendendo quase, a meio da cana do nariz, de máquina fotográfica suspensa num dos seus ombros, fosse talvez, um dos maiores valores da nossa aldeia.
Trata-se do senhor padre Tomás.
Foi professor no austero Mosteiro da Ordem dos Beneditinos em Singeverga, onde reparou para a vida monástica alguns monges.
Recusando-se limitar a sua actividade de docente a uma condição medíocre, era frequentemente exigente, estimulava e incentivava os alunos na progressão e formação pessoal e académica, bem como em outras práticas do desenvolvimento intelectual, valorizando as capacidades dos jovens estudantes.
As afirmações que acabo de proferir, baseiam-se no relato de uma experiência vivida e contada na 1º pessoa, de um antigo aluno seu e por coincidência o mesmo veio a ser meu aluno também na Universidade Sénior, no passado ano lectivo em Gouveia, quando ali cumpria serviço docente na Escola Secundária daquela cidade.
É uma história singular, que me deixou perplexa, orgulhosa e muito honrada.
O já referido aluno, um reformado chefe dos correios é actualmente um aguarelista e desenhador de reconhecido valor como artista naquela terra . O seu nome é Fernando Pereira Gonçalves, conhecido no meio beneditino no ano de 1959, como Frei Urbano ou Fernando Chaves, por ser natural da cidade de Chaves ; na primeira 1ª aula após ter-me apresentado, perguntou-me se não havia na minha família um padre com o nome de Tomás Gonçalinho. Estava longe da Terra, por isso seria pouco provável encontrar ali alguém do relacionamento dos meus familiares. Assim, fiquei estupefacta com tal pergunta e dei por mim a repetir mentalmente a frase: “O mundo é pequeno, muito pequeno!...”.
Meia encavacada ainda por tão inesperada situação, respondi que o meu falecido pai era primo direito do senhor D. Tomás.
Durante a aula nesse dia, o tema de conversa foram pequenas histórias passadas em Singeverga.
O tempo passou… chegou o encerramento do ano lectivo e todos nós, alunos e professores estávamos envolvidos numa grande azáfama a montar uma exposição de trabalhos (pintura de azulejos), no átrio da Escola Secundaria, após o que nos deviríamos dirigir ao refeitório onde o Conselho Executivo preparava um lanche avantajado para todos nós. Discursos e mais discursos, seguiram-se aos comes e bebes. Ouviu-se alguém pedir a palavra, fez-se silêncio!...
Era o Senhor Fernando que, dando uns passos em frente e falando pausadamente como era seu hábito, contou que tinha sido aluno de um familiar meu, guardando desse tempo boas recordações. Acrescentou ainda que D. Tomás era um homem de alto valor intelectual, um profundo conhecedor de música e um homem que dominava vários saberes tendo-o marcado com o seu exemplo de bom mestre. Relatou episódios passados nos ensaios musicais, que preparavam para os rituais religiosos, em que o senhor padre Tomás se tornava particularmente exigente, pois para ele as coisas tinham de atingir a perfeição.
O presidente do Conselho Executivo estava simplesmente abismado e tomando a palavra, acrescentou que 10 anos antes, na mesma Escola Secundária de Gouveia tinha leccionado um professor“Gonçalinho”a disciplina de desenho. Era o Carlos, filho do "tio Zé dos óculos" como era conhecido, mas seu nome; José Gonçalinho, irmão do padre Tomás.
Os diálogos animaram-se e todos quantos ali estavam ficaram com uma imagem brilhante da família Gonçalinho.
Por último digo: pudesse cada um de nós um dia, merecer idênticos elogios!...

Celeste Gonçalinho de Oliveira Duarte 27/10/2005

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