quinta-feira, julho 13, 2006

Vestir de novo a memória

Coisas insignificantes
em muito semelhantes
a um simples vestido de chita,
tornaram a minha vida mais bonita
porque me identificava com elas
e era nelas
que me revia,
pois semelhavam-se a mim,
e assim,
encontrava a minha alegria.

Faz parte da minha história
um vestido,
o mais velho certamente
que retenho na memória;
tinha pregas e era comprido.
Era de Inverno e era quente,
com padrão axedrezado
muito pouco elaborado,
no entanto,
sei de onde vem o encanto,
que me leva a recordá-lo...

Para melhor me lembrar
tive de recuar,
regredi no tempo,
perdida no pensamento.
De súbito parei,
porque encontrei
um feliz momento,
em que usava o tal vestido
axedrezado e comprido...

Fixei-me na minha tenra idade,
no meu tempo sem maldade,
em que me apoiava
na varanda da minha avó,
onde nunca estava só!...
e falava desenganada,
a quem na rua passava
e se divertia,
com o que eu dizia.

Faço nova pausa
por uma boa causa,
descubro outro vestido
um vestido de Verão,
manga curta de balão
curto e franzido;
mas este é cor de pérola.
Lembro-me bem que assim era...

Paro por um momento,
retenho o pensamento
num episódio inesquecível
e incrível
no qual intervinha eu com o tal vestido
franzido
e uma velhinha,
a senhora Rafaela,
e ainda que me lembre pouco dela,
recordo com saudade
a sua extrema bondade!

Um dia ,
quando esse vestido trazia,
subi a sua escada,
ela estava à porta sentada
e eu um tanto vaidosa,
esperava anciosa
um elogio ao dito vestido
franzido...

Porém, a bondosa senhora era invisual
e disse-me que nada via,
mas que distinguia
o bonito do feio
e para não ficar mal,
para satisfazer o meu anseio,
passou-lhe as mãos levemente
o que me deixou muito contente!...


No entanto fiquei confusa,
com a sua cegueira
pensei que era brincadeira,
ficou-me uma ideia muito difusa
do significado de ver.
quis então saber
para me certificar
e portanto constatar,
só assim podia compreender...

Cerrei os meus olhos então,
e nada via,
mas sentia
sobre mim a sua mão.
Abri-os e continuava a ver,
nunca percebendo a verdadeira razão;
fiquei baralhada e sem isso perceber.
E se for verdade
que existe eternidade,
poderei um dia encontrá-la
e abraçá-la
talvez me possa esclarecer!...


Celeste Gonçalinho De Oliveira Duarte

Sem comentários:

Reativar este blog

Iniciado em 2005, este blogue cumpriu em parte, aquilo para que tinha sido inicialmente projetado. Com o decorrer do tempo e tal como n...